DEUS NA FÍSICA - PARTE I


A discussão em torno da existência – ou inexistência – de Deus é sempre espinhosa. No âmbito da metafísica, essa discussão, ao que me parece, se tornou infrutífera. Não obstante, o desafio de se falar de Deus sempre se reinventa.

No contexto da história da física, Deus sempre foi lugar comum para muitos pensadores e seus sistemas filosóficos. Aristóteles imortalizou a idéia do primeiro motor: a realidade é movimento. Mas só é possível existir o movimento se, em princípio, existir o primeiro motor. Sendo este último a causa, ele próprio é desprovido de movimento. No século XVII, Galileu Galilei buscou o entendimento entre os saberes da igreja e os da nova física, já em ascensão. É do mestre italiano a famosa frase: "A matemática é o alfabeto com o qual Deus escreveu o universo." Na Óptica, Sir Isaac Newton enunciaria que o espaço é o “sensório de Deus”, expressão que lhe custou muitos embates com outros pensadores do seu tempo. Leibniz que o diga.

O deus filosófico e cristão de Newton resistiu como parâmetro essencial da física moderna, mas se dissolveu nas extensas demosntrações matemáticas de Laplace. Ao ser questionado por Napoleão sobre a presença de Deus em seu sistema filosófico, Laplace respondeu com ímpeto: “Eu não precisava dessa hipótese”. A nova física – a Dinâmica – era capaz de prever o futuro. Nada na natureza escaparia ao rigor das demosntrações matemáticas derivadas do cálculo diferencial. Deus foi convidado a se retirar, com sua ira e necessidade de adoração, do seio da mentalidade científica dos séculos XVIII e XIX.
Ouviremos falar de Deus, outrossim, por meio da boca do físico alemão Albert Einstein. Pertence ao pai da Teoria da Relatividade a famosa citação: “Deus não joga dados”. Ainda persistem discussões acaloradas entre deístas, teístas e ateísta sobre a suposta religiosidade do gênio alemão. O fato é que para Einstein a imagem de Deus estava mais próxima à descrição de um deus in natura, defendida por Baruch de Spinoza no século XVII, ou seja, um deus natureza despreocupado com as questões pessoais dos miseráveis seres humanos.

A física, contudo, parece atrair para si as questões pertinentes ao problema da existência ou inexistência de Deus. A mecânica quântica têm-nos mostrado que quanto mais fundo se vai ao seio da matéria, mais insubstancial ela aparenta ser. A metáfora da realidade feita de matéria e energia cedeu lugar à metáfora da realidade feita de informação. A Taoria da Relatividade agregou o tempo ao espaço, criando a noção de espaço-tempo: podemos estar parados no espaço, mas jamais no tempo, pois não é o tempo que passa – somos nós é que passamos no tempo. É mesmo?

Mas o que isso tem a ver com Deus?

A arquitetura, ora. A complexidade do mundo natural é sedutora. E isto nos tráz de volta às velhas questões: Como? Por quê? A perfeição e coerência da natureza nos leva a interrogar o corpo da obra. Se é uma arquitetura deslumbrante, quem – ou que ou o quê – é o arquiteto?

Conjecturas a parte, a verdade incontestável é que a elaboração conceitual da física, assim como a de qualquer ciência, é impregnada dos valores culturais, sociais e ideológicos do espírito humano. A idéia do arquiteto supremo – existindo ou não – é um valor que a maioria de nós cultiva na alma. Impossível deixá-lo de fora, assim como foi impossível para Pascal, Descartes, Leibniz ou Newton seguir em frente sem o arquiteto supremo, seja ele Deus ou o diabo.

Luciano Simões